Vagas de garagem: um bem escasso da vida urbana no centro de disputas judiciais

Recurso valioso no mundo moderno, as vagas de garagem têm sido objeto das mais diversas disputas judiciais. Públicas, privativas, pagas, estreitas, largas, livres ou reservadas para determinado grupo de pessoas, as vagas se tornaram um bem escasso e imprescindível para a organização das cidades.

As discussões que chegam ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) vão desde simples disputas patrimoniais pela vaga na divisão de bens até situações mais complexas, como a definição desse espaço como bem de família e os limites de sua alienação judicial.  

Ação reivindicatória não é válida para pleitear vaga sem registro independente

Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, em um ##condomínio edilício##, a vaga de garagem pode ser enquadrada como unidade autônoma (artigo 1.331, parágrafo 1º, do Código Civil), desde que tenha matrícula independente no registro de imóveis, sendo, então, de uso exclusivo do titular. Pode ainda ser considerada direito acessório, vinculado a um apartamento, sendo, assim, de uso particular. Ou área comum, quando sua fruição couber a todos os condôminos indistintamente.

No julgamento do REsp 1.152.148, seguindo o voto de Salomão, a Quarta Turma decidiu que a ação reivindicatória não é cabível para pleitear direito exclusivo de vaga de estacionamento quando este configura direito acessório da unidade autônoma ou área de uso comum, pois nessas hipóteses não há o requisito essencial para seu ajuizamento: a individualização do bem.

O recurso foi interposto contra decisão das instâncias ordinárias que determinaram ao condomínio de um edifício que demarcasse uma vaga a mais na garagem para os proprietários de um apartamento, já que compraram a unidade com direito a duas vagas, conforme constava na escritura pública. O condomínio alegou que não havia espaço suficiente e que a demarcação da segunda vaga prejudicaria os demais moradores.

“A verdade é que parece não ser possível o ajuizamento da reivindicatória quando a coisa reclamada se enquadra como direito acessório da unidade autônoma ou como área de uso comum, uma vez que, nessa hipótese, a compropriedade resultante da existência de diversos proprietários sobre frações ideais caracteriza-se exatamente pela ausência de descrição da extensão, limites e confrontações do bem litigioso”, afirmou o relator, observando que não havia matrícula independente da vaga no registro de imóveis.

Ao dar provimento ao recurso, o ministro lembrou que os autores da ação teriam outros meios de buscar seus direitos – por exemplo, uma ação indenizatória contra a construtora.

Possibilidade de alienação da vaga a outro condômino

Nos termos do artigo 2º, parágrafo 2º, da Lei 4.591/1964, o direito à guarda de veículo na garagem do edifício “poderá ser transferido a outro condômino, independentemente da alienação da unidade a que corresponder, vedada sua transferência a pessoas estranhas ao condomínio”.​​​​​​​​​​​​

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Segundo a ministra Nancy Andrighi, embora a vaga de garagem seja, em regra, bem acessório vinculado à unidade habitacional, admite-se, independentemente de lhe ser atribuída fração ideal específica de terreno, a sua separação para transferência a outro apartamento do mesmo edifício.

Esse entendimento foi adotado pela Terceira Turma no julgamento do REsp 954.861, para reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que considerou necessária a modificação da natureza de uma vaga de garagem, em procedimento no cartório de registro de imóveis, para que ela pudesse ser transferida a outro condômino.

Para o colegiado, não há necessidade de procedimentos especiais para a transferência de vaga de garagem pelo respectivo dono a outro morador do edifício, independentemente da alienação do apartamento a que estava vinculada.

Hasta pública de boxe em garagem deve ser restrita aos condôminos

Nesse mesmo sentido, no REsp 2.008.627, a Segunda Turma estabeleceu que, nas alienações judiciais, a hasta pública destinada a vender vaga de garagem deve ser restrita aos condôminos, salvo autorização em contrário expressa na convenção condominial.

O colegiado reformou decisão do TRF4 que, em execução fiscal movida pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), considerou possível a alienação de um boxe de estacionamento a pessoas estranhas ao condomínio, visto que a lei não teria criado nenhum impedimento à expropriação judicial desse tipo de bem.

A relatora do caso, ministra Assusete Magalhães, destacou precedente da Quarta Turma (REsp 316.686) no qual o colegiado de direito privado afastou a impenhorabilidade da vaga de garagem, definindo que, se o bem pode ser alienado a outro condômino, pode ser penhorado e vendido em hasta pública, com preferência aos condôminos. 

A ministra ponderou que a redação dada pela Lei 12.607/2012 ao artigo 1.331, parágrafo 1º, do Código Civil, veio para conferir maior segurança aos condomínios, de forma que tanto a doutrina quanto outros tribunais têm decidido no sentido de que, em tais casos, a hasta pública deve se restringir aos condôminos.​​​​​​​​​​​​

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Vaga de garagem não constitui bem de família para efeito de penhora

Uma das orientações mais frequentemente adotadas pelo STJ na solução de conflitos relacionados a vagas de garagem é o enunciado da Súmula 449, aprovada pela Corte Especial em 2010, segundo a qual “a vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora”.

Um dos precedentes que deram origem à orientação sumular foi o REsp 1.138.405, de relatoria da ministra Eliana Calmon (aposentada). No julgamento, a Segunda Turma reformou acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que entendeu que o boxe de estacionamento integrante de imóvel residencial, mesmo sendo unidade autônoma e única, com matrícula individualizada, estaria abrangido pelo benefício da impenhorabilidade do bem de família.

Para a relatora, a decisão contrariou a posição jurisprudencial do STJ, que admitia a penhora de boxe ou vaga de garagem quando esta constitui unidade autônoma, de conteúdo patrimonial individualizado em relação ao único imóvel residencial.

Legitimidade passiva para cobrança de IPTU de boxe de garagem

A ministra Assusete Magalhães também relatou, na Segunda Turma, o AREsp 337.190, no qual o colegiado reafirmou a jurisprudência a respeito da legitimidade passiva em cobrança do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU). No caso, o município de Blumenau (SC) ajuizou execução fiscal contra o promitente comprador de um imóvel, objetivando receber o crédito tributário decorrente da incidência de IPTU sobre o apartamento e o respectivo boxe de garagem, dos quais o comprador tinha a posse.

O tribunal estadual deu parcial provimento à apelação do município, para reconhecer a cobrança do IPTU em relação ao apartamento, excluindo, contudo, o imposto em relação à vaga de garagem, por entender que a sujeição passiva ao IPTU se daria com a propriedade, e não com a posse.

A relatora destacou que a jurisprudência pacífica do STJ é no sentido de que tanto o promitente comprador do imóvel (possuidor a qualquer título) quanto o proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no registro de imóveis) são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU.

Para a ministra, o entendimento da corte estadual estava em dissonância com a jurisprudência do STJ, uma vez que afastou a legitimidade do executado ao simples fundamento de que ele não figurava, no cartório de registros de imóveis, como o proprietário do boxe de garagem, deixando de considerar que o município tinha a prerrogativa de indicar como sujeito passivo do IPTU o promitente comprador.

Prazo para contestar metragem de garagem

Ao verificar a decadência do prazo, a Terceira Turma, no REsp 1.899.941, negou o pedido de um consumidor para ser indenizado em razão de a vaga de garagem adquirida, juntamente com um imóvel, possuir metragem diferente da que constava no contrato.

Segundo alegou o comprador, no contrato constava que a vaga teria 12 m², quando, na realidade, possuía 10,87 m². Ele afirmou que incidiria o prazo prescricional geral de dez anos para o pedido de indenização.

No entanto, o relator, ministro Moura Ribeiro, lembrou que a orientação firmada no âmbito do STJ, para a pretensão ao direito de abatimento no preço de imóvel, decorrente da diferença de metragem entre a área real do bem (no caso, a vaga de garagem) e a constante do contrato, decai em um ano, conforme o artigo 501 do Código Civil.

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